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O "Vitaphone-Movietone" da Western Electric Co.
Neste sistema, o filme era exibido em sincronia com discos de vinil. Foi amplamente utilizado e comercialmente bem sucedido. Precedeu o Movietone, sistema de filme baseado na gravação em película. Para mais informações sobre estes sistemas, clique aqui e aqui.

Anúncio de 12/07/1929 divulgando a exibição do filme "Duas Gerações" no cine Republica.










Sistema Vitaphone de projeção sincronizado com áudio gravado em vinil.




















Anúncio de 20/09/1929 divulgando a estreia do filme "O Cantor de Jazz", para 23/09/1929, no cine República.






















Estreia no New York City Theatre.

















Agradeço a colaboração de Luiz Carlos P. da Silva e Nair B. P. da Silva.

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Cine Theatro Republica

HOJE
29 de Dezembro

Festejando hoje o seu primeiro anniversario, offerece ao distincto publico paulistano dois grandes espectaculos de gala em commemoração da auspiciosa ephemeride.

Interna e externamente, o theatro estará engalanado com flores, festões, folhagens, illuminação feérica de deslumbrante effeito.

Grande orchestra de 80 professores especialmente contratados para este faustoso dia. Regencia do proficiente maestro paulista MARTINEZ GRAU.

1ª sessão - ás 19 hs. em ponto

2ª sessão - ás 21 horas e meia

Cada sessão terá inicio com a execução da admiravel
PROTOPHONIA DO GRURANY
do immortal compositor brasileiro CARLOS GOMES.

Será em seguida focalisada na téla uma edição interessantissima do
ROSSI-ACTUALIDADES
Incontestavelmente o mais bello lavor da cinematographia nacional, produzido expressamente para o glorioso dia de hoje, que marca, tambem, o primeiro anniversario do apreciado "magazine-film".
Summario interessante de que se destacam as scenas capitaes do photo-drama "PERVERSIDADE", posado em S. Paulo por Innocencia Collado e Antonio Tagliaferro; da engraçada comedia paulista CARLITINHO, de que são interpretes os irmãos Vassallo; do drama social "PRELUDIO QUE REGENERA", por Lucia Lais e Waldemar Moreno e do cine-drama "A CULPA DOS OUTROS", por Medina Filho e Carlos Ferreira.

Assistiremos, após, as primeiras exhibições de uma das mais empolgantes obras da famosa marca norte-americana PARAMOUNT-ARTCRAFT

DE MARINHEIRO A COMMANDANTE

ULTIMA SUPER-PRODUCÇÃO ESPECIAL PARA 1922
SCENAS EMOCIONANTES - SITUAÇÕES ADMIRAVEIS - INTERPRETAÇÃO MAGISTRAL
Duas genuinas glorias da moderna cinematographia desempenham os principaes personagens desta linda pellicula:
DOROTHY DALTON e RUDOLPH VALENTINO

O espectaculo terminará com a execução, a grande orchestra, do grandioso poema symphonico CENTENARIO do maestro Savino De Benedictis.

Só uma vez, até hoje, se fez ouvir esta admiravel composição: foi durante as festas officiaes commemorativas do centenario da INDEPENDENCIA NACIONAL.

PREÇOS HABITUAES:
Frisas e camarotes, 12$000 - Poltronas numeradas, 2$200 - Galerias, $800

AVISO AO PUBLICO

AS POLTRONAS SÃO NUMERADAS PARA AS SESSÕES DE HOJE E OS RESPECTIVOS BILHETES SERVEM SOMENTE NA SESSÃO PARA QUE FOREM EMITTIDOS.

PARA SUA MAIOR COMMODIDADE, O DISTINCTO PUBLICO DEVE PREVENIR-SE NA BILHETERIA DURANTE O DIA, COM A POSSIVEL ANTECEDENCIA, PARA EVITAR ATROPELOS A' ULTIMA HORA.

AMANHAN: - Vesperal elegante da COMPANHIA ABIGAIL MAIA, com a encantadora comedia de Oduvaldo Vianna - MANHANS DE SOL - A' NOITE: PARIETTE, continuação do lindo cine-romance da Gaumont. Bilhetes numerados á venda desde hoje.

Leia mais sobre o cine-theatro Republica.

Agradeço a colaboração de Luiz Carlos P. da Silva e Nair Brustolin P. da Silva.

Anúncio do jornal "O Estado de S. Paulo", de 29 de Dezembro de 1922.

Clique na imagem, para ampliá-la.

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Anúncios da primeira exibição no Brasil do Cinemascope, realizada em 09/02/1954, no cine República.



Anúncio do jornal "Folha da Noite", de 08/02/1954.

Link interessante: Widescreen Museum
Agradeço a colaboração de Nair Brustolin P. da Silva e Luiz Carlos Pereira da Silva.

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1937
1940
1961
1961
1962
1962
1971
Agradeço a colaboração de Nair Brustolin P. da Silva e Luiz Carlos Pereira da Silva.

Grandes empresários da exibição cinematográfica: Marcio Fraccaroli

Por Natalí Alencar (Redatora da revista Exibidor, publicação trimestral da Tonks)

Com mais de 32 anos de experiência dedicados ao cinema, grande parte deles na trajetória de sucesso da Paris Filmes, Marcio Fraccaroli se orgulha de possuir o cinema no seu DNA.

Desde os 13 anos ele trabalha com cinema e aos 19 passou a integrar a equipe da Paris Filmes como gerente de marketing. Hoje, como principal liderança desta empresa, conta para a revista Exibidor como conquistou posição de destaque no mercado cinematográfico. Dedicação, visão empreendedora e escolhas assertivas têm feito da trajetória de Marcio Fraccaroli um caminho sólido que resultou na consagração da Paris Filmes como uma das mais respeitadas e tradicionais distribuidoras independentes do país.

Formado pela Escola Superior de Propaganda e Marketing (ESPM) e pós-graduado pela Fundação Getúlio Vargas, Fraccaroli passou apenas por duas empresas: a Companhia Cinematográfica Serrador e a Paris Filmes, que desde 2009 vem se destacando por ter trazido grandes sucessos mundiais como “A Saga Crepúsculo”, “P.S. Eu Te Amo”, “RED - Aposentados e Perigosos”, além dos mais recentes “O Discurso do Rei”, “Santuário” e as produções nacionais “De Pernas pro ar” e “As mães de Chico Xavier”.

Em entrevista exclusiva, ele falou sobre mercado, tendências e perspectivas. Confira:

Revista Exibidor - Comente mais um pouco da sua trajetória no mercado cinematográfico.

Marcio Fraccaroli - Comecei aos 13 anos como auxiliar de publicidade. Também levava curtas e trailers para cinema e programação para o jornal. Conheço desde a programação de cinema até um pouco de exibição. Acompanhei a Paris Filmes quando ela tinha quase 170 salas de cinema, portanto tenho experiência de exibidor e distribuidor.

Exibidor - Como tem percebido o mercado exibidor ao longo desses últimos anos?

Fraccaroli - O mercado de exibição tinha parado há dez anos por falta de investimento e de visão de negócio. Com a nova tecnologia 3D, o exibidor tomou uma postura de crescimento e começou a se desenvolver de uma forma maior. Ele passou a enxergar o 3D como oportunidade para as pessoas frequentarem mais o cinema. Além disso, tivemos a felicidade da volta do cinema nacional, que ajudou muito a indústria. Isso sem falar na economia, que continua crescendo. Com mais dinheiro no bolso, as pessoas vão mais ao cinema. Houve uma mudança nos últimos 15 anos. Grandes exibidores entraram no mercado e isso movimentou o setor. Com uma nova safra de pessoas que dirigem a indústria, tanto de exibição, como de distribuição, surgiram também novas ideias. Essa transição foi importante e contribuiu muito.

Exibidor - Qual a importância do mercado exibidor para a Paris Filmes?

Fraccaroli - A Paris Filmes é uma companhia independente que distribui filmes para a América Latina. Basicamente, nosso negócio é distribuição para cinema, vídeo e televisão. Porém, nossa principal janela é o cinema, que hoje representa 40% do faturamento. O vídeo representa 20%, a TV aberta abrange 30% e a TV fechada, 10%. O cinema é muito importante para a nossa estrutura de negócio. A cada dia, nos preocupamos mais em contratar conteúdo que faça sentido para o nosso mercado. Tentamos nos antecipar às decisões, porque nossos concorrentes não são só as empresas independentes, mas os estúdios americanos que também compram. A Paris Filmes está na vanguarda das empresas independentes e me sinto confortável em falar isso, porque tenho no meu DNA o cinema. Algumas empresas independentes têm como principal nicho outros mercados de atuação. Mas eu, como representante da Paris Filmes e até mesmo pela minha formação, tenho no meu DNA o mercado cinematográfico. Eu nasci no cinema.

Exibidor - Como você avalia o crescimento da Paris Filmes? Quais fatores contribuíram e continuam contribuindo para o seu crescimento?

Fraccaroli - Filmes são feitos por escolhas. Distribuições são feitas por oportunidades e decisões. A Paris Filmes tem tido um pouco de sorte ao escolher os melhores filmes. Somos líderes de mercado há três anos. Como não somos estúdio, é muito complicado competir com empresas como Sony e Warner, que produzem seus próprios conteúdos. No mercado independente, nossas escolhas foram muito felizes. Acertamos com “A Saga Crepúsculo”, mas em 2005, quando optamos pela compra, foi uma decisão de risco. Hoje, falamos muito sobre “O Discurso do Rei”, mas há 1 ano e meio atrás, talvez estivéssemos comprando um filme de arte que não agradasse. Enfim, são escolhas, decisões. A Paris Filmes se associou a Summit, um estúdio que produz no exterior e que tem uma distribuidora de vídeo e cinema nos Estados Unidos. É a maior empresa de entretenimento neste país. Inclusive, foi favorecida pela “Saga Crepúsculo”. Isso, estrategicamente, foi muito bom para nós. A Paris Filmes está presente em toda a América Latina e isso nos ajuda a ter acesso aos filmes. Hoje, somos uma empresa estruturada, temos um escritório em Los Angeles, que representa 17 países e outro, que trabalha para nós há 20 anos, e representa o maior comprador de filmes independentes da França, Japão, Itália e Rússia. Isso dá acesso a conteúdos. Eu acabei de tomar a decisão de comprar um filme hoje, se vai dar certo daqui dois anos, não sei. Mas contei com essa estrutura para escolher. O que eu acho que a Paris tem de bom, é que ela se associa e é mais plural. Temos uma tradição na área de exibição, por exemplo, somos os únicos sócios da Cinemark, temos dois complexos de cinema em Belo Horizonte e somos sócios do Severiano Ribeiro. Eu conheço muitos exibidores. Eles me conhecem. Relaciono-me com as pessoas. Fomos um dos grandes exibidores na década de 80 e 90, embora hoje não administremos nenhuma sala de cinema. Logo, temos uma relação com o mercado que começou há muitos anos.

Exibidor - Além do 3D, quais tendências têm observado no mercado e como a Paris Filmes tem aproveitado essas tendências no seu market share?

Fraccaroli - O 3D não é fundamental para a indústria crescer, mas sim bons filmes e boas histórias em qualquer língua. Precisamos ter uma indústria de grandes filmes brasileiros, sadios e vencedores. Fazemos alguns investimentos em 3D, mas só isso não adianta. O que faz a diferença é boas salas de cinema, ótima prestação de serviços, atendimento adequado ao público e grandes filmes.

Parte do texto publicado na revista Exibidor nº 1, de abril de 2011. Publicação autorizada pela autora.

Georges Jean Renouleau, o pioneiro da exibição cinematográfica em São Paulo

Por José Inácio de Melo Souza

Georges Jean Renouleau, fotógrafo de origem francesa (Bergerac, 7/12/1845), antes de se fixar em São Paulo montou ateliês em Pelotas (1875), Porto Alegre (1878) e Rio de Janeiro (1883-84). Começou a trabalhar na capital paulista a partir de 1885-89, com ateliê fotográfico na Rua Direita, 9. Passou depois para a Rua Marechal Deodoro, 2 (em 1895, atual 15 de Novembro), cujas instalações se incendiaram acidentalmente; Rua General Câmara, 108 (1897), Rua Bento Freitas, 7-A (1897), Rua Direita, 24 (1898-99) e Rua Bento Freitas, 23 (1902).

Como fotógrafo, Renouleau deveria ter contato com os produtos fotográficos da fábrica Lumière, de Lyon, a Société Anonyme des Plaques Lumière. A conjunção decorrente da situação funesta do incêndio do seu ateliê, pelo qual não recebeu os dois seguros a que teria direito, e o aparecimento de uma nova mercadoria, o Cinematógrafo, provavelmente fez com que fosse à França para se iniciar no novo ramo. Consta que teve como sócio na exploração do invento André Bourdelot, que tinha aberto uma loja de brinquedos na Rua Boa Vista, 48-A, em 3/2/1896. Ambos viajaram para a Europa para tratarem da exploração do invento.

O Cinematógrafo tinha sido patenteado em 13/2/1895 por Auguste e Louis Lumière, tendo uma primeira apresentação pública em 22 de março na sala da Société d’Encouragement pour l’Industrie Nationale, quando se apresentou o filme La sortie des usines Lumière (a primeira sessão paga foi no salão inferior de bilhar, o Salon Indien, do Grand Café, Boulevard des Capucines, 14, em 28/12/1895). Porém, entre março de 1895 e maio de 1897, os Lumière não vendiam seus projetores e filmes, preferindo explorá-los por meio de agentes próprios. Renouleau provavelmente foi obrigado a se contentar com uma contrafação do Cinematógrafo Lumière, sendo que nunca usou diretamente a marca de Lyon (segundo Alice Gonzaga, Bourdelot, quando desembarcou no Rio de Janeiro a 5/6/1896, vindo de Bordeaux, intitulou-se “representante do Dr. Merey”, isto é, Étienne-Jules Marey, o inventor da Cronofotografia, posta a venda em 1891). Nas suas apresentações em São Paulo ele se referiu ao “aparelho-fotografia animada”; nas de Porto Alegre, ao “scinematógrapho” e “Animatógrafo modelo francês”. Do conjunto de cerca dez filmes que compunham o seu repertório, somente dois foram identificados como claramente de produção Lumière.

Em 7/8/1896, uma sexta-feira, os dois empresários convidaram o presidente do Estado, Campos Sales, e outras autoridades importantes no panorama da cidade para a estreia da nova invenção: a fotografia animada. A recepção pelos jornais, publicada no dia seguinte, foi divergente. O Estado de S. Paulo noticiou entusiasticamente, na primeira página, o programa exibido (“admirável, assombroso”), embora se enganasse quanto à primazia da projeção pioneira na América Latina (um aparelho chamado Omniógrafo tinha funcionado no Rio de Janeiro em 8 de julho daquele ano). Já o Diário Popular foi reticente: “Fundado nos mesmos princípios que o kinetoscópio, o processo Renouleau deixa ainda alguma coisa a desejar; o movimento não é perfeito, de modo que as figuras desenham-se com um tremor constante que lhes prejudica a nitidez. Esperemos que este inconveniente desapareça com ulteriores experiências. Contudo, é digna de louvores a iniciativa do Sr. Renouleau”.

Em sociedade com André Bourdelot, que tinha chegado a São Paulo em 1890, e classificado por Alice Gonzaga como “financiador da primeira sessão cinematográfica paulista”, ele montou seu projetor na Rua Boa Vista, 48-A, no mesmo endereço da loja de brinquedos do seu sócio e compatriota, pagando ao Tesouro Municipal a quantia de Rs 43$000 (quarenta e três mil réis) sendo trinta mil réis pela licença e treze mil réis pelo alvará para a “exposição do aparelho-fotografia animada” por 30 dias (1/8/1896). Na Rua Boa Vista, nº 48, funcionava o Frontão Paulista. O número 48-A era o de uma loja térrea, como se pode ver pela planta. Pelas dimensões, e ainda como negócio de Bourdelot, o prédio não tem as características de “casarão vazio” adaptado, como escreveu Máximo Barro. Ele organizou apresentações públicas pagas e diárias entre 8 de agosto e, provavelmente, 7 de setembro com três sessões de quatro filmes à tarde (13, 14 e 15 horas) e quatro à noite (18, 19, 20 e 21 horas) ao preço de Rs 1$000 (mil réis) a cadeira. Ao final da licença, no início de setembro, ele eliminou as sessões diurnas.

Encerradas as exibições em São Paulo, partiu para Porto Alegre, onde estreou a 8/11/1896. A sua carreira de exibidor ambulante terminou aí, pois no ano seguinte voltou à profissão de fotógrafo. Em 14/2/1898, Bourdelot transferiu a casa de brinquedos para Eduardo Gay. Sabe-se que em 1911 ele era fabricante de joias na Rua Boa Vista, 39-A, com filial na Rua do Rosário, 14. Os negócios devem ter ido bem porque naquele ano pediu o aumento de um prédio na Rua Tomé de Souza e a construção de duas casas na Rua Duarte de Azevedo, no bairro de Santana.

Renouleau foi casado em segundas núpcias com Rosa Maria Martin.

Texto disponibilizado na internet.

Cinema de rua é preservado em São Carlos

Ao contrário da capital, que fechou um dos únicos cinemas de rua, o cine Belas Artes, São Carlos mantém seu cinema de rua em plena atividade através da cinematográfica Casella & Casella, que exibe filmes do circuito nacional de cinema e, também, serve de cenário para a realização de eventos voltados para a cultura são-carlense.



A existência de um cinema de rua em São Carlos fortalece o compromisso da Prefeitura com investimentos em cultura. “Além do fortalecimento do audiovisual da cidade, o cinema de rua fortalece o imaginário e resgata a nostalgia da população de São Carlos. As gerações mais antigas têm boas lembranças de quando iam ao cinema, e este ritual de ir ao cinema está sendo transmitido às gerações mais novas”, diz Telma Olivieri, coordenadora de Artes e Cultura de São Carlos. Graças à parceria com a Prefeitura, é possível realizar as sessões com preços mais acessíveis ao público.



Pedro Casella, dono da cinematográfica Casella & Casella, lembra a importância das prefeituras e do poder público na manutenção e conservação de patrimônios culturais como o cinema de rua. “Se a Prefeitura de São Carlos não tivesse comprado o prédio, o cinema seria apenas um quadro na parede”, lembra.



Telma Olivieri também ressalta a importância de iniciativas tomadas pela Prefeitura para a preservação da cultura e que, esta característica, coloca São Carlos à frente de outras grandes cidades. “São Carlos está na contramão das grandes cidades brasileiras, não só por adquirir o prédio do cinema, mas também por existir um comprometimento da administração do cinema com o poder público. São Carlos talvez seja uma das únicas cidades a valorizar o cinema de rua, destaca. Ela também lembra que, o cinema de rua é mais democrático. “É a valorização do cinema democrático que, por estar localizado no centro, qualquer pessoa pode ter acesso, pois a região é a mais acessível da cidade e, pela freqüência das pessoas, acaba sendo revitalizada”.



A programação do cine São Carlos está disponível no site ou pelo telefone (16) 3307-6006.
Prêmio
O cine São Carlos foi contemplado com o Prêmio Adicional de Renda, promovido pela Ancine (Agencia Nacional de Cinema), que contempla os ganhadores que exibem grande quantidade de filmes nacionais, com um prêmio em dinheiro que deverá ser aplicado na revitalização da sala. Um dos critérios para a escolha dos ganhadores é o cinema possuir no máximo duas salas.



História
A história de São Carlos com o cinema vem de muito tempo. A primeira exibição de filmes aconteceu em 1897, com o cinematográfico Lumière e, em 1969, a cidade realizou o Festival de Cinema Brasileiro de São Carlos. Atualmente, o cine São Carlos comemora dois anos de reinauguração no mês de novembro. O cinema possui capacidade para 540 pessoas e o equipamento de som é o Dolby Digital, que garante um alto nível de qualidade para os frequentadores.

Texto publicado, em 18/01/2011, no site São Carlos Agora.

A cinelândia da Liberdade

Por Lúcia Nagib (Crítica e pesquisadora de cinema, autora de diversos livros sobre cinema japonês, foi professora na Universidade de Campinas. Atualmente leciona na Universidade de Leeds, na Inglaterra.)

A história do cinema no Japão é marcada ao mesmo tempo por inovação e tradição. Nascido ao final do século XIX, pouco depois de se estabelecer na Europa, era fruto tanto do avanço industrial e comercial quanto do teatro tradicional japonês, especialmente o kabuki, que abrigou as primeiras casas de produção de filmes, como a Nikkatsu e a Shochiku. O cinema tornou-se, assim, parte essencial da identidade cultural japonesa, acompanhando até o outro lado do globo aqueles que haviam deixado o Oriente para tentar a sorte no Novo Mundo. Por José Fioroni e Edna Kobori sabemos que curtas-metragens noticiosos ou documentais do Japão circulavam no interior paulista ao longo dos anos 20. O mais antigo registro dessa presença data de 1929, quando foi fundada, por Masaichi Saito, a Nippaku Shinema-Sha (Companhia Cinematográfica Nipo-Brasileira), primeira exibidora comercial de filmes japoneses no Brasil, sediada na cidade de Bauru. A Nippaku passou a importar filmes de ficção de longa metragem, conquistando cada vez mais espectadores na longínqua diáspora.


Cine Jóia: produções da Toho, incluindo obras primas de Akira Kurosawa

A distribuição dos filmes pelo interior paulista se dava pelas estradas de ferro Noroeste, Paulista, Sorocabana e Mogiana que cortavam as lavouras. A própria Nippaku realizou um filme, intitulado Noroeste-sen isshu (1929), documentando essa saga. Conforme informam Fioroni e Kobori, essa atividade cinematográfica envolvia uma complicada operação. Toneladas de equipamentos tinham de ser transportadas em caminhões por estradas de terra esburacadas a locais desprovidos de luz elétrica, onde os filmes eram projetados em galpões de madeira do modo mais bizarro: um gerador improvisado era alimentado pelo próprio caminhão, em cujo motor atava-se uma correia movimentada por sua roda traseira, suspensa no ar.

O progresso do cinema na matriz tinha reflexos curiosos nos trópicos. No Japão, a chegada do cinema sonoro no início dos anos 30 pusera um fim abrupto à profissão de benshi. Sabe-se que muitos países usavam explicadores na época do cinema silencioso, mas, como bem observa Donald Richie, em nenhum lugar essa figura adquiriu a importância que teve no Japão. Os benshi eram atores profissionais, frequentemente provindos do kabuki, cujo papel era traduzir ao espectador japonês os exóticos hábitos ocidentais, como o beijo na boca. Também cabia ao benshi construir uma história, quando o filme se constituía de vários fragmentos curtos, dando-lhe, ao final, um sentido moral. Vendo-se na rua da amargura, muitos desses explicadores, fiéis à profissão como verdadeiros samurais, não se conformaram, chegando a atitudes extremas. Foi o caso, por exemplo, de Heigo Kurosawa, um talentoso benshi de 27 anos que, ao ser demitido, se suicidou, conforme relato emocionado de seu irmão mais novo, Akira Kurosawa, que com ele aprendera a gostar de cinema. Outros benshi desempregados, porém, preferiram tentar a sorte no Brasil, onde o cinema mudo persistia e lhes ofereceria mais alguns anos de carreira.

Mas é claro que o ramo cinematográfico também progredia por aqui. No começo dos anos 30, o cinema japonês viu-se promovido da vida ambulante para teatros fixos, com a transferência da sede da Nippaku para a capital paulista. Em 1932, o bairro da Liberdade já contava com dois mil japoneses residentes, e essa população crescente garantia público para projeções a princípio avulsas, em salões alugados, e em seguida no cine-teatro São Paulo, que passou a incluir filmes japoneses em sua programação. As distribuidoras de filmes japoneses se multiplicaram, destacando-se, dentre elas, a Nippon Kinema, fundada por Kimiyasu Hirata em 1935. Nesse período, o público já tinha acesso a obras importantes de Minoru Murata, Shigeyoshi Suzuki, Tomotaka Tasaka, e há registro da projeção de algumas obras-primas, como A feiticeira das águas (Taki no shiraito, 1933), de Kenji Mizoguchi.

A próspera atividade foi, porém, subitamente interrompida com a entrada do Japão na 2ª Guerra Mundial, em 1941. Os japoneses do Brasil passaram a ser perseguidos, sobretudo após o governo Vargas romper relações diplomáticas com o Japão, em 1942. Muitos foram expulsos de suas residências na Liberdade, seus jornais e escolas foram fechados e seus núcleos culturais se esfacelaram.

Com o fim da guerra em 1945, os problemas começaram a se resolver, embora a rendição japonesa tenha originado sérios conflitos em meio à colônia nipônica. Parte dos japoneses (os kachigumi) se recusava a aceitar a derrota do país na guerra, opondo-se aos pragmáticos (os makegumi), que aceitaram a nova situação. Distúrbios e assassinatos na colônia nipônica impediram, por exemplo, o lançamento do filme Vida de artista (Ruten, 1937), de Buntaro Futagawa, que Hirata estava promovendo em 1946. Após associar-se a Saito, fundando a Nippaku Kogyo, Hirata finalmente conseguiu lançar o filme em 1947, no cine São Francisco, com grande sucesso. Começava um novo período de desenvolvimento para o cinema japonês no Brasil, em boa parte, é claro, em função de seu florescimento no Japão. De fato, entre os anos 40 e 50, o Japão se consolidou como o segundo maior produtor mundial de filmes, atrás apenas da Índia, e à frente dos Estados Unidos.


Cine Niteroi, em dois endereços. Grandes produções da Toei, entre elas a série Miyamoto Musashi, de Tomu Uchida

Além do São Francisco, vários cinemas em São Paulo passaram a exibir filmes japoneses. Mas não davam conta da oferta, gerando assim a necessidade de salas voltadas exclusivamente para a produção nipônica. É quando tem início a época áurea do cinema japonês no bairro da Liberdade, com a fundação em 23 de julho de 1953, por Yoshikazu Tanaka, do cine Niterói, na rua Galvão Bueno. O cinema de 1500 lugares ficava no andar térreo de um prédio de cinco andares, que abrigava ainda um hotel e um restaurante. O filme de estréia, Os amores de Genji (Genji monogatari, Kozaburo Yoshimura, 1951), era uma superprodução da Daiei, e o sucesso foi tal que, um ano depois, inaugurava-se um segundo cinema japonês na Liberdade, o cine Tóquio.

Percebendo o potencial do novo mercado, as produtoras japonesas decidiram distribuir diretamente no Brasil. Em 1958, o cine Tóquio passou a ser o exibidor da Toho que, no ano seguinte, transformaria o cine Jóia em seu lançador. O cine Nippon transformou-se no exibidor da Shochiku, e o Niterói, da Toei. Em 1962, o cine Tóquio passou a se chamar Nikkatsu, tornando-se exibidor exclusivo dessa produtora. Eram no total quatro cinemas japoneses que transformavam a Liberdade numa verdadeira Cinelândia nipônica.

Nos anos 60, era entretenimento regular entre a colônia japonesa – e sofisticado entre a classe artística brasileira – ir ao cinema na Liberdade. As chances eram grandes de se ver clássicos de Kobayashi, Kurosawa, Toyoda, Shibuya, Uchida, ou películas inovadoras de Shindo, Masumura, Sugawa, Shinoda, Teshigahara, Oshima. Mas no final da década já se notavam sinais de declínio, acompanhando a própria crise na matriz, onde as produtoras enfrentavam a dura concorrência da televisão.

Os cinemas japoneses da Liberdade começaram a sofrer transformações. Em 1967, o Nikkatsu fechou. Em 1968, o Niterói mudou de endereço, para dar lugar ao metrô, e passou a sobreviver de filmes do gênero yakuza, ou máfia japonesa. Em meados dos anos 70, a Toho encerrou sua distribuição no Brasil. Em 1980, com o fechamento do cine Nippon, a Shochiku passou a exibir seus filmes no Jóia, que também não resistiu muito, fechando em 1987. O Niterói ainda tentou sobreviver, mostrando pornochanchadas brasileiras para cumprir a lei de obrigatoriedade de filmes nacionais, mas acabou fechando um ano depois, em 1988. Era o fim da Cinelância da Liberdade.

Parte do texto “O Cinema Japonês em São Paulo” publicado no site de *Jo Takahashi.
*Jo Takahashi é consultor de arte e cultura na Japan Foundation, onde atuou por 25 anos como administrador cultural. Agora, migra esta experiência para a sua produtora independente, a Dô Cultural, que propõe um conceito design de formatar e desenvolver o projeto cultural.

O melhor texto sobre o tema salas de cinema - Texto premiado

Por Francisco J B de Aguiar
Salas de Cinema de São Paulo
Para nós, habitantes das cidades do séc XX e XXI, cinema era e é coisa corriqueira, como supermercado: faz parte do dia a dia. Assim, uma crônica sobre cinemas será no mais das vezes um relato de miudezas, sem fatos extraordinários, experiência múltipla e difícil de organizar. Mas é desse material mesmo que se fazem as crônicas, então vamos tentar...
Nos anos 50, quando estreei a primeira calça comprida, alguns cinemas do Centro, como o Rivoli e o Normandie (atenção para os nomes!) eram ligeiramente solenes: exigia-se terno e gravata, inclusive dos meninos – pequena complicação que lhes garantiu um lugarzinho na memória dos garotos da minha geração. Eram também bonitos, com tapetes fofos, capazes de matar um asmático, e quando o filme era mais longo (lembro-me em especial de A Volta ao Mundo em Oitenta Dias, em que saí da sessão apaixonado por Shirley MacLaine, no papel de uma indiana deslumbrante), havia um intervalo no meio da sessão. Podia-se então ir comprar dropes (já ouviu falar?), chocolates e refrigerantes na bombonnière (era assim mesmo que a gente chamava o balcãozinho onde se vendiam doces) ou ficar ouvindo um pianista (havia um piano num palco em frente à tela), talvez última reminiscência dos tempos do cinema mudo. Quase um acontecimento!
Cine Rivoli, um importante cinema inaugurado em 1958
Já nos cinemas da Rua Augusta e da Consolação, perto de minha casa, não havia nada disto; cinemas de bairro, e havia montes deles naquela época em que se falava muito de viagem à Lua, mas nem o mais ousado futurólogo previa a invenção do DVD. Alguns ficavam em locais hoje bastante improváveis: um na Rua Turiassu, em Perdizes, ou numa rua tranqüila da Aclimação, outro na Vila Guarani... Esse, por sinal, acabou virando salão de baile e, como reforma custa caro, conservou a arquitetura de sala de cinema, em declive, mais parecendo uma pista de skate que um lugar para dançar.
Podia-se entrar no meio da sessão e ficar para a seguinte. Talvez as salas fossem mais escuras, ou talvez fosse um cabide de emprego, mas existiam “lanterninhas”, que te ajudavam a encontrar lugar, com uma luz bem fraquinha, para não atrapalhar quem já estava lá. Talvez fosse só uma questão de delicadeza.
Em vez de 20 minutos de trailers, 20 minutos de documentários. Eu gostava do Canal 100, mostrando jogos do Campeonato Carioca: as seqüências em que os jogadores apareciam em câmara lenta, articulando em silêncio palavrões tremendos, viraram mais tarde cenas hilárias do grupo Língua de Trapo. Em vez de desenho animado da companhia de seguros pedindo para desligar os celulares, o sinal de que o filme ia começar era dado por um gongo retumbante, que ocupava toda a tela. Logo depois aparecia ainda o certificado da Censura Federal, devidamente assinado. A censora Solange T. Hernandes, a “Dona Solange” de ingrata memória, acabou sendo até “homenageada” em uma música do Léo Jaime. Havia as matinées – e muitas nem eram de manhã – com filmes de Tom e Jerry (eu torcia sempre pro gato), Gordo e Magro, e do Carlitos, a que eu comparecia eufórico, acompanhado da babá.
Ao escrever esta crônica, percebo que minhas lembranças se prendem muito mais aos filmes; não tenho nenhuma recordação especial das salas, como não tenho, por exemplo, das lojas do Pão de Açúcar. Para não ser injusto, declaro, porém, que ainda guardo vagamente a imagem das cadeiras do cine Paulista, novinhas, brancas com riscas pretas como a gloriosa bandeira do nosso estado, vandalizadas pelo público de Rock Around the Clock, exibido dias antes. Bill Halley e seus Cometas anunciavam um novo tempo e eu, na inocência dos meus 6 anos, nem desconfiava.
Os gatos do cine Astor, hoje Livraria Cultura, andavam por todo canto, passeavam pelos guichês, faziam companhia à bilheteira e não miavam durante as sessões. O Comodoro na Avenida São João, lembrado pela inovação: parecia que você estava dentro da tela, no carrinho, descendo a Montanha Russa a 120 por hora. Uma amiga jurava que tinha assistido a 5 sessões seguidas para rever as imagens de um tsunami (atualmente é professora de Filosofia). As pessoas se abaixavam, gritavam... Além desses, o Marachá (onde arranjavam esses nomes?), na baixa Augusta, onde aconteceram por um tempo, às sextas feiras à meia noite, as memoráveis sessões malditas, ponto de encontro de uma tribo divertida e galhofeira, meio intelectual, meio de esquerda. O Bijou, na Praça Roosevelt, cinema de arte, onde assisti ao filme com o título mais bonito que já ouvi: “Vaghe stelle dell’Orsa...”, de Luchino Visconti. E as grandes salas do Centro, testemunhas dos tempos áureos da Sétima Arte: o Marabá (hoje tombado), o Ipiranga, com capacidade para quase 2000 espectadores, que já conheci transformado em refúgio de office boys que iam matar o tempo. Esses cinemas grandes tinham um andar de cima, com boa visão da tela, por sinal; para sobreviver, alguns foram divididos em 5 ou 6 salinhas, outros não resistiram à concorrência da TV e do Vídeo.
Nos cinemas japoneses da Liberdade, na São Paulo já cosmopolita dos anos 50, era possível ver filmes de grandes diretores como Kurosawa e Ozu, antes até que em Nova York ou Paris.
A história segue, agora com poltronas mais confortáveis, compra de ingressos pela Internet, mas os lugares não têm mais cara, como, também, os próprios shoppings que os abrigam. Muitas salas antigas viraram templos Pentecostais e outros que tais. Um amigo diz que crente não pode ver um cinema sem pensar logo em fazer uma Igreja. Vocação litúrgica de lugares onde, há mais de 100 anos, pessoas começaram a se reunir diante de uma tela prateada? Ou quem sabe é a religião que está ficando cada vez mais próxima do cinema? O espetáculo continua...

Espetáculo na plateia

Por Pedro Cavalcanti e Luciano Delion
Para as gerações criadas com televisão na sala é difícil imaginar o que já foi a aventura de uma ida ao cinema no centro da cidade. Sobretudo a partir dos anos vinte, quando do tão sonhado “casamento entre o projetor e a vitrola” surgiu o cinema falado.

Ainda que assistir o filme fosse a parte fundamental, absolutamente não esgotava o programa. Este incluía encontros com amigos, conversas na fila, exibição de elegância e namoros à distância, os únicos permitidos. Foi assim desde os tempos do velho cine Central em frente ao Correios, onde os filmes eram mudos, mas os espelhos da sala de espera permitiam trocas de olhares, os mais significativos, como recorda Yolanda Penteado (1903-1983 - uma das pessoas mais ricas e influentes dos anos 40, 50 e 60), assídua freqüentadora nos seus tempos de mocinha.

Nesse tempo, as salas de exibição eram teatros adaptados, ainda com balcões, camarotes e frisas dispostos em forma de ferradura, como no Santa Helena, na Praça da Sé, ou no Dom Pedro II, no Anhangabaú. Vieram depois os verdadeiros palácios, com milhares de lugares, onde o espectador sentia-se parte do espetáculo. Essa mudança se iniciou em 1929, com o Paramount na Av. Brigadeiro Luiz Antonio e o cine Rosário, no prédio Martinelli, com paredes revestidas de mármore de Carrara. Coisa nunca vista, oferecia poltronas estofadas.
O UFA-Palácio já em 1936 e o Metro em 1938, ambos na Av. São João, inauguraram o espaço da chamada Cinelândia que, além da própria São João, incluía o Largo do Paissandú, o Santa Ifigênia e a Av. Ipiranga. O UFA, projetado pelo arquiteto Rino Levi foi um caso à parte com suas linhas sóbrias. Já o Metro e a maioria dos que surgiram no seu rastro acompanhavam a arquitetura e a decoração dos cenários de Hollywood, alternando alegremente construções em estilo mourisco com o neoclássico afrancesado e incluindo cópias de estátuas, fontes murmurantes e arco-íris luminosos que se refletiam em espelhos.

Sugeridos pelas produtoras americanas, os nomes lembram exotismos suntuosos e monumentais. São os mesmos que começavam a brilhar em todas as grandes avenidas do mundo: Rex, Roxy, Capitólio, Imperial, Alhambra, Plaza, Odeon, Art-Palácio, Opera, Babylonia, Ritz. Exceção nacionalista apenas no nome, o Ipiranga surgiu para arrasar a concorrência com seu slogan “Um Monumento ao Cinema”. E realmente não parecia outra coisa. Inimá Simões, autor do livro “Salas de Cinema em São Paulo”, descreve: “O filme que bate na tela e a sala de projeção estão em plena harmonia, formam quase que uma coisa única, uma união consensual. (...) O Espetáculo começava já na calçada, muito antes da platéia ser escurecida, e é bastante provável que os freqüentadores vissem apenas uma parte do que acontecia no filme, livrando um olho para acompanhar a atmosfera de encantamento. (...) Quando alguém diz que viu ‘Seis Destinos’ não vem à cabeça o nome do diretor Julien Duvivier, mas sim uma constatação: Ah, esteve no Ipiranga!”.

Essa fantasia inocente de considerar o prédio do cinema como parte do filme teve seu momento de glória em 1954, durante o Festival Internacional de Cinema que marcou o quarto centenário da cidade. Pessoas que só existiam nos filmes materializaram-se subitamente na sessão de gala do cine Marrocos. Lá estavam, entre outros, Ronda Fleming, Erich Von Stronheim, Fred Mac Murray, Edward G. Robinson, Jeannette MacDonald e Michel Simon. E, sobretudo, lá estava, caminhando sobre o tapete vermelho da escadaria de entrada, como no tombadilho de um navio, o grande Errol Flynn, mais conhecido na vida das telas como Capitão Blood, Robin Hood, ou O Gavião do Mar.
No dia 25 de janeiro de 1954, enquanto uma garoa brilhante feita de triângulos de papel prateado caía sobre a cidade celebrando o quarto centenário de sua fundação, o Centro entrava em longo período de decadência. O comércio, os escritórios de luxo, o dinheiro mudavam-se para os outros bairros da “cidade que mais cresce no mundo”.
Apenas agora, depois de mais de meio século de esquecimento, o Centro começa a acordar de novo. Em rara conjugação dos poderes públicos com a iniciativa privada impulsionada pela Associação Viva o Centro, prédios são restaurados (como, por exemplo, os cines Olido e Marabá), repartições públicas voltam a antigos endereços e o comércio procura soluções de renovação.
Há tantos fatores em jogo que, para muitos, a tarefa parece impossível. Talvez não seja. Muito já foi realizado e muito se planeja. O essencial está em preservar a força daquela ligação emocional com a cidade, presente no coração de todos os que conheceram São Paulo no tempo de sua juventude. Ouvia-se, então, a propósito de tudo, uma exclamação que, segundo a entonação, podia exprimir alegria, ou tristeza, desalento, ou entusiasmo, e cujo significado profundo só os paulistanos mais antigos conhecem: “Eh! São Paulo!”
Ilustrei esta postagem com fotos do cine Ipiranga, da época de sua inauguração. É o cinema do Centro que eu mais gostaria que voltasse a funcionar. Ele poderia ser todo restaurado. Sua arquitetura foi assinada por Rino Levi e é de grande valor histórico. Veja texto sobre Rino Levi neste blog. - Antonio Ricardo Soriano
Texto do livro “São Paulo - A Juventude do Centro”, de Pedro Cavalcanti e Luciano Delion - Grifo Projetos Históricos e Editoriais - 2004

Quantos cinemas possui esta Paulicéia querida?

Quantos cinemas possui esta Paulicéia querida? 
Creio que o número oscila entre 3 a 4 dezenas. Um cinema para cada 20 mil pessoas…

Vão ser inaugurados novos: um todo liró, gracioso à Rua Domingos de Morais, quase vis-à-vis ao Phénix; outro à Av. Tiradentes, que será fatalmente um quartel de uma nova espécie naquela via guerreira, outro ainda à Barra Funda, o Roma, nome para atrair uma multidão de patrióticos súditos de sua majestade Victor Emmanuel que moram nas vizinhanças; e o mais luxuoso e confortável, à Rua São Bento. Este irá competir com o Triângulo. Ambos lutarão pela preferência do exército de “picturers” que, após o ‘footing’, a pé ou em auto pelas ruas da cidade, dão a vida por uma fitinha.

Qual o mais simpático: o República ou o Santana? Quanto ao primeiro, dizem (os proprietários) ser o preferido da “elite” paulistana. Do segundo os proprietários dizem a mesma coisa …

O Avenida é o mais ruidoso dos cinemas paulistanos: logo à entrada um ‘jazz band’ bombardeia o sistema nervoso do público. Na sala de exibição que é úmida, mas bem mobiliada, acotovelam-se crianças, velhos, moços e senhores. Mas como são engraçadas as senhoras, os moços e os velhos do Avenida

O Central é a antítese do seu colega da Av. São João. Como o Paraíso, é um cinema honesto e pacato. Freqüentam-no as meninas bem educadas dos Campos Elíseos e os velhos que sabem ser velhos. 

O São Pedro, encravado na fronteira de dois bairros antagônicos – um é inimigo da gravata, outro usa sabonete Windsor – tem, por força da sua posição dois públicos. Representam-nos o ‘Paschoal o bicheiro’ (que resmunga contra a tirania do colarinho e a exorbitância do preço da cadeira) e a Sra. Dona Maria Saudosa de Antanho, que usa “mitenes” negras e é avó de três meninas-moças de cabelos compridos. 

Outros cines existem com suas fisionomias próprias. Cada um reflete o seu bairro, “a alma encantadora da rua” de que faz parte. Bonitos uns, feios outros, são todos, porém respeitáveis. Principalmente, os últimos, dentro dos quais o nosso povo esquece, seguindo as aventuras de um filme em séries, toda a série de desventuras que não são de celulóide. 
(Crônica de Jorge Martins Rodrigues, publicada no Diário da Noite em 1927)

A crônica apresentada, escrita em 1927, descreve com glamour e imponência a situação da distribuição das salas de cinema na cidade de São Paulo da época. Mas a dicotomia entre salas do centro e salas de bairro não se deram ao acaso e não permanecem assim até hoje. A exibição cinematográfica na cidade está envolta em diversos processos e fatores que permitem a essa o título de maior metrópole do País.

Leia o texto “O crescimento do cinema na cidade de São Paulo. Salas do Centro x Salas de Bairro” na íntegra.

Centerplex de Barretos tem inauguração prestigiada e cheia de emoção

A cerimônia de inauguração do complexo de cinemas Centerplex no North Shopping Barretos (Barretos/SP), que aconteceu em 17 de março, foi marcada pela emoção. Cerca de 300 convidados, entre profissionais de imprensa, autoridades e formadores de opinião da cidade prestigiaram a abertura oficial das três salas de cinema.


O que mais chamou a atenção foi a decoração do hall de entrada do complexo, a bomboniere e a qualidade de projeção e som das salas (fotos).

Apresentada por Gigi Monteiro, a cerimônia de inauguração foi marcada por momentos de emoção. O discurso do fundador da rede Centerplex, Eli Jorge de Lima, destacou o árduo trabalho exigido para uma obra do porte de um complexo de cinemas como o de Barretos. “Trabalho com cinema há 40 anos e minha empresa fará 30 anos daqui um mês, mas cada vez que inauguro um novo cinema é para mim uma emoção como no começo da minha carreira. Agradeço a Deus, a minha família, ao grupo North e a Barretos por mais essa inauguração”, disse emocionado o fundador do Centerplex e atual presidente do Sindicato dos Exibidores do Estado São Paulo.

Sobre as salas
O complexo Centerplex North Shopping Barretos tem três salas de exibições, duas com sistema convencional e uma com tecnologia 3D. Cada uma das duas salas convencionais tem capacidade para 214 lugares, sendo duas vagas para cadeirantes, em cada sala. Já a sala 3D tem 230 lugares, três para cadeirantes. O sistema de projeção utiliza equipamentos automáticos e o som tem qualidade digital. O local conta ainda com estrutura de monitores de vídeo onde a programação é exibida, bilheterias com telas onde é possível escolher os assentos, pois as poltronas são numeradas; espaço de convivência decorado com móveis de design sofisticado e Bombonière com guloseimas variadas, bebidas e a tradicional pipoca em várias opções.


Sobre o Centerplex
Centerplex é a empresa São Luiz de Cinemas, iniciada no Cine São Luiz, de Poços de Caldas, em Minas Gerais, há quase 30 anos. Segundo levantamento da entidade de pesquisa da área, Filme B, a Empresa São Luiz de Cinemas figura entre as 15 maiores empresas de cinema do país. Fundada em 1981, hoje possui mais de 30 salas espalhadas pelos Estados de São Paulo, Minas Gerais, Ceará e Alagoas. A empresa, em 1999, criou a marca Centerplex Cinemas, complexo de cinemas com a qualidade São Luiz de Cinemas. E ainda programa filmes para a cidade de Porto Velho-RO.

North Shopping Barretos
Via Conselheiro Antônio Prado, 1400 - Pedro Calvani - Barretos/SP Telefone: (17) 4003.7041
Texto do site oficial do North Shopping Barretos.

Profissionais da exibição: Benedito Carlos Silva, projecionista

Uma vida atrás do projetor

Conheça a história de Benedito Carlos Silva, o projecionista que trabalhou por 25 anos no cine Gemini

Por Mariana Zylberkan (para o jornal “Diário de S. Paulo”, de 29/09/2010)

O projecionista Benedito Carlos Silva, de 51 anos, é preciso ao contar o tempo que dedicou a exibir filmes no cine Gemini até o encerramento de suas atividades, no último domingo: "Foram 25 anos, 14 dias e algumas horas", diz.

A resposta reflete não apenas o pesar de ter encerrado a história de um dos cinemas mais emblemáticos da cidade, mas também o prazer de exercer a profissão que escolheu aos 12 anos de idade, quando morava em Francisco Alves, no Paraná. Foi no pequeno cinema da cidade, administrado pelo padre da igreja, que Benedito deu os primeiros passos no ofício de projetar filmes. "Ia sempre ao cinema e fazia a maior bagunça com as outras crianças. Por isso, fui proibido de assistir aos filmes na plateia. Só podia ver na cabine de exibição".

A partir daí, o que era para ser um castigo se transformou na maior paixão de sua vida. Benedito passou a ir todos os fins de semana ao cinema para aprender a rebobinar rolos de filme e montar o projetor.

A função de ajudante foi logo ultrapassada depois que o único projecionista da cidade teve um enfarte e ficou impedido de continuar trabalhando. "O cinema é a minha paixão. Deixei de estudar e aceitar boas propostas de emprego para me dedicar a isso", diz ele sobre a profissão que exerce há 30 anos.

Em São Paulo, Benedito trabalhou na cabine de cinemas que fizeram parte da história cultural de São Paulo, como Comodoro, Marabá, Ritz, Olido, Iguatemi, entre outros.

Além de funcionário, Benedito é também um frequentador assíduo das salas de cinema da cidade. Até quando está em casa ele não deixa de lado a sétima arte e conta estar sempre na frente da TV assistindo um dos 200 DVDs de sua coleção. "Gosto de filmes de bangue-bangue", diz o projecionista.

Foto: Daniel Pera/Diário SP

Profissionais da exibição: Projecionista

Vai dar rolo
Projecionistas - Carreira: muitos funcionários passam para as cabines depois de trabalharem na portaria. Que carreira? A profissão não é regulamentada por lei

Por Juliana Araújo (para o jornal “O Estado de S.Paulo”, de 25/02/2008)

O pipoqueiro e a simpática recepcionista que me perdoem, mas a figura mais importante do cinema fica escondida dentro da cabine - o projecionista. É a performance deste profissional que define a qualidade da sessão de um filme em 35 milímetros. Para aprender a montar um filme, ajustar o som ou o foco, no entanto, não existe escola. Os operadores cinematográficos aprendem a trabalhar na prática.

Em cinemas como Espaço Unibanco, Reserva Cultural e Belas Artes, é comum que projecionistas experientes ensinem o ofício a ex-porteiros e até a ex-faxineiros. "Tentamos criar uma espécie de plano de carreira", afirma a gerente do Reserva, Cynara Regina de Oliveira. Ex-porteiro do extinto cineclube Vitrine, José Alberto começou a treinar com os colegas um ano antes de ir para as cabines do Espaço Unibanco. Hoje, orgulha-se de ter ensinado a função para um dos projecionistas do Unibanco Arteplex, que era porteiro na antiga Sala UOL .

O diretor de programação do grupo Espaço de Cinema, Adhemar de Oliveira, explica que a empresa tem uma "política de formação de quadros próprios". Operador há mais de 25 anos, Jucelino Silva é outro exemplo: experiente, faz até pequenos consertos nos equipamentos.

Presidente do Sindicato dos Operadores Cinematográficos de São Paulo, Benedito Carlos Silva também aprendeu observando, há mais de 25 anos. Mas hoje defende a criação de um curso que prepare os futuros projecionistas. "Alguns cinemas contratam pessoas inexperientes e as jogam nas cabines", diz ele. "Não é difícil fazer o trabalho, mas algumas técnicas e cuidados devem ser ensinados". Benedito infernizava as sessões de uma sala de Guaíra, no interior do Paraná, até que foi mandado 'de castigo' para a cabine. Quando o projecionista morreu, ele era o único que sabia operar a máquina. Em pouco tempo, a oportunidade virou ofício. Além do treinamento, ele considera que a qualidade da projeção depende da quantidade de filmes que cada operador coordena - até três é o ideal, no caso de cabines individuais.

Nos cinemas multiplex, em que todos os projetores ficam em uma só sala, redes como a Cinemark mantêm no máximo dois operadores. "Um sozinho já conseguiria cuidar de tudo tranqüilamente", diz Luciano Silva, gerente do departamento técnico.

Para garantir a qualidade da projeção, os funcionários da Cinemark - a maioria com 2º grau completo - passam por um treinamento padrão de 30 dias. Além disso, uma equipe especializada faz manutenção preventiva nos projetores de todas as salas a cada trimestre. Os outros cinemas também têm técnicos, mas os projecionistas, de tão experientes, é que acabam responsáveis pela manutenção.

Fotos do blog "Fetiche de Cinéfilo", de Armando Maynard.

O blog na Revista do Tatuapé

Muito obrigado a Maisa Infante (Editora) e toda equipe da Revista do Tatuapé, pela divulgação do blog.
Conheça a revista:
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Quando a porta do cinema dava para rua

Por Osmar Mendes Junior
No ensolarado domingo, mais exatamente nas primeiras horas do dia, após uma noite de sono tranqüila e uma substanciosa refeição matinal, eu tive a ousadia de ligar o computador para consultar os meus perfis nas duas mais concorridas redes sociais da Internet: o "Twitter" e o "Facebook". Eu deveria ter aproveitado aquela bela e clara manhã de verão para realizar algo mais interessante, como uma saudável caminhada pelas ruas do meu bairro, mas não resisti aos apelos dessa maquininha infernal que se instalou definitivamente na minha existência. Então, uma animada conversa que se desenvolvia entre os meus amigos do Facebook chamou a minha atenção pelo assunto palpitante que tratava: o triste sumiço dos cinemas de rua na cidade de São Paulo. Lamentava-se o fato daquelas simpáticas salas, que um dia enfeitavam e coloriam ruas, alamedas, praças e avenidas, terem sido transformadas em frios estabelecimentos comerciais, em feios e improvisados estacionamentos ou em tenebrosos e suspeitos templos religiosos, que assustam as suas obedientes plateias com ameaças de punições para pecados inevitáveis.



Os “Windsors”, os “Brasílias”, os “Normandies”, os “Jussaras” e os “Ritz” e tantos outros já não existem mais. É triste, mas essa é a dura verdade! Aquelas salas cheias de glamour, onde moravam o sonho e a imaginação e que, antes da chegada da televisão no Brasil, tantas alegrias proporcionaram para os paulistanos nas décadas de quarenta, cinqüenta e sessenta do século passado agora fazem parte de doces e históricas recordações manifestadas em bate-papos nas redes sociais. Eu disse televisão? Pois foi exatamente na televisão que uma saudosa sala paulistana de cinema teve o seu dia de glória. Foi em 17 de abril de 1966, há 45 anos. O cinema se chamava Universo (veja o que restou da fachada dele na foto acima), ficava em uma galeria no número 360 da Avenida Celso Garcia, no Bairro do Brás, e tinha duas características que lhe davam grande destaque no mundo da cinelândia brasileira: uma imensa plateia com 4.324 lugares que lhe conferia o status de ser a maior do Brasil e um incrível teto móvel que se transformava em gigantesca clarabóia em noites de calor, conforme você pode conferir na foto abaixo.

Foi no “Cine Universo” que o cantor Roberto Carlos, aquele que parava o calhambeque na contra-mão e queria que tudo mais fosse para o inferno, comemorou seus 25 anos de idade com um show espetacular que reuniu as maiores estrelas da “Jovem Guarda”. O agitado, barulhento e concorrido programa musical comandado pelo “Rei da Juventude” era um fenômeno de popularidade e um dos mais vistos da TV Record, que, com apenas 13 anos de existência (a emissora foi inaugurada em 23/09/1953), “roubava” os espectadores dos velhos, charmosos e simpáticos cinemas de rua, que iniciavam a fase de irreversível decadência. Coincidentemente, aquele 17 de abril de 1966 também foi um domingo ensolarado e bonito. E eu vi o show do “Brasa” de casa, com a família, na minha televisão portátil. As imagens eram transmitidas em preto e branco. Nunca mais esqueci.

Exibição: do monopólio ao pluripólio

Por Luiz Gonzaga de Luca*
Profundas modificações no setor de exibição cinematográfica ocorreram simultaneamente à implantação do cinema sonoro no país, que se iniciou em 1928 e que perdurou por cinco anos, quando, finalmente, o cinema mudo deixou de existir. Nesse momento histórico em que o cinema alcançava o status quo de mais importante entretenimento popular, verificou-se o esgotamento do modelo de negócios vigente desde o término do século XIX com a primeira exibição comercial, atribuída a Paschoal Segretto.
Durante os vinte anos subsequentes a essa sessão no Rio de Janeiro, muitos cineteatros foram abertos, apresentando uma composição de diferentes conteúdos que integravam um “programa cinematográfico”, mesclando sketches cômicos, operetas, números de mágica e interpretações musicais com a projeção de curtas e médias-metragens das mais diversas procedências, inclusive de produção nacional.
Diversos empresários advindos do circo, da cena musical ou do teatro adotaram a exibição do filme como atividade integrante de seus múltiplos negócios. Um deles, Francisco Serrador, sobressaiu-se, investindo tanto nos negócios de produção como nos de distribuição e de exibição.
Adquiriu os direitos de filmes das mais diversas procedências, acabando por controlar o setor com a aquisição da mais importante carteira de filmes, composta por películas francesas distribuídas pelo famoso fotógrafo Marc Ferrez. Nessa negociação, adquiriu também as salas de cinema que lhe eram pertencentes. Adicionalmente, detinha a distribuição de filmes de alguns estúdios norte-americanos que, até então, tinham importância secundária mesmo dentro do seu próprio território.
Com a total disponibilidade de conteúdos nas mãos e com um grande circuito de cinemas abertos em Porto Alegre, Curitiba, São Paulo e Rio de Janeiro, sua empresa cinema passou não só a representar a liderança no mercado como a ditar as regras de comercialização dos produtos, atuando sob o regime de monopólio.
Entender o que foi uma atuação monopolística em uma sociedade não organizada e não regulamentada pelo Estado é difícil em nossos dias. À época, tinha-se na “verticalização” das três pontas do setor cinematográfico (produção, distribuição e exibição) um trunfo imbatível, sendo considerado um comportamento comercial regular. Era comum que o produtor do filme fosse seu distribuidor e, ainda, seu exibidor, colocando-o em cartaz apenas em seus cinemas.
Um filme lançado exclusivamente numa sala da antiga Capital Federal só seria exibido em outro cinema após longo prazo da data de seu lançamento, como se podia atestar pelos cartazes que constaram até a década de 50 nos cinemas da rede Metro, em que se destacava que o filme ali exibido não poderia ser visto em qualquer outra sala da cidade nos próximos seis meses. Quando retirada de exibição em seu cinema lançador, a cópia iniciava uma peregrinação que atingia primeiramente os cinemas da cadeia do proprietário do título em exibição, para depois, seguir para os cinemas “agregados”, numa sequência estabelecida por quem pagava mais. Ser “agregado” significava que, além de pagar os valores referentes à locação do filme, tinha-se que pagar um “pedágio” ao circuito exibidor líder.
O domínio de Francisco Serrador era inquestionável e quase sem limites, a tal ponto que se viu instigado a implantar uma Cinelândia no Rio de Janeiro, seguindo o mesmo modelo que encontrou numa viagem a Nova York, quando se construía o Times Square. Uma área totalmente degradada era substituída por fantásticos cinemas, teatros, restaurantes, hotéis, em um intenso e dispendioso processo de substituição urbana que foi muito bem sucedido empresarialmente.
O duopólio nacional
Francisco Serrador retornou ao Brasil obcecado em lançar um Times Square nacional, que complementasse a modernidade imposta pela abertura da Avenida Central com seus edifícios majestosos promovidos por Pereira Passos e Rodrigues Alves no projeto republicano da modernização da então Capital Federal. A área desejada para a megaincorporação seria o terreno do antigo Convento da Ajuda, localizado na ponta final da revolucionária avenida e que fora derrubado para nada ali se instalar.
O resultado de tão ambicioso empreendimento, após a instalação de parte dos estabelecimentos projetados seria a insolvência do grande empresário. Serrador se viu obrigado a entregar a maioria de suas ações aos investidores que compunham um consórcio com fins específicos da construção do Quarteirão Serrador, o qual passaria a ser conhecido por Cinelândia. Menos de dois anos depois, as ações seriam revendidas ao empresário cearense Luiz Severiano Ribeiro, um exibidor que atuava em algumas cidades do Nordeste e que já tinha algumas salas na “região da Leopoldina” na cidade do Rio de Janeiro.
A efetivação dessa transferência acionária modelaria um novo perfil à exibição brasileira com um contorno de duopólio em que Serrador detinha o controle na região Sul e São Paulo e Severiano Ribeiro, do Rio de Janeiro e do Nordeste, evitando-se a competição predatória de ambos em seus territórios “protegidos”. Tal configuração permitiu que a Companhia Serrador desse movimento à transferência do polo exibidor de São Paulo, saindo da região da Praça da Sé para o Largo do Paissandu, constituindo-se assim, a Cinelândia paulistana.
As quebras de monopólios: os novos circuitos regionais
A nova configuração adotada no ano de 1928 vigeria até os meados da década de 1950, quando o exibidor Paulo Sá Pinto, até então proprietário de uma única e quase insignificante sala de exibição, o Ritz na Avenida São João da capital paulistana, decidiu quebrar o monopólio regional. Aproveitando-se dos conflitos comerciais da Companhia Serrador com os estúdios United Artists, conseguiu tomar a carteira de filmes desse distribuidor, o que lhe permitiu a aquisição de outras salas, como o Marabá e o República. Logo mais, se associaria aos irmãos Francisco (Chiquinho) e Magalhães Lucas e a Chico Verde, então sócio da distribuidora independente Condor Filmes. Essa empresa era detentora de direitos de fies europeus, em especial espanhóis, que teriam no final da referida década, produções de grande expressão econômica, como o recordista Marcelino, pão e vinho, as produções com a atriz e cantora Sarita Montiel e da cantora mirim Marisol.
A atitude dos sócios resultaria na expansão de um novo e forte circuito cinematográfico, a Sul Paulista. Porém, mais do que estabelecer uma simples alternativa para programação dos filmes, representou a quebra do monopólio de exibição nos “territórios” da Serrador.
Nos territórios dominados por Severiano Ribeiro surgiria, no final da década de 1950, um desafiante com o mesmo destemor de Paulo Sá Pinto: Lívio Bruni. Ex-sócio minoritário de Severiano em um negócio nos subúrbios do Rio de Janeiro, o empresário foi financiado pela Columbia Pictures, que se sentia desprestigiada por Severiano. Assim, foram abertos diversos cinemas na região metropolitana do Rio de Janeiro, em São Paulo e em algumas capitais do Norte e Nordeste.
Com salas bem localizadas, tendo equipamentos e instalações que representavam a modernidade, tais como os carpetes espessos e macios, os aparelhos de ar-condicionado, as poltronas de espaldar alto e os projetores de 70mm, Bruni conseguiu cooptar diversos estúdios norte-americanos e distribuidores independentes, passando a competir em igualdade com o circuito de Severiano Ribeiro. Envolvidos em práticas de competição extremada, pagando percentuais descabidos aos distribuidores, os dois grupos não identificaram a grave crise financeira que se instalara no país após o Golpe Militar de 1964, quando ocorria uma incontrolada inflação.
Tentando atingir melhores percentuais de negociação sobre os filmes, Bruni decidiu partir para a sua própria distribuição, adquirindo títulos europeus, ou seja, dedicou-se a uma atividade em que não possuía grande experiência. O resultado foi catastrófico, levando-o a uma concordata, que também foi o caminho escolhido por Severiano Ribeiro. Nesse último caso, devido a seu forte lastro imobiliário, a saída seria um caminho rápido e não traumático, enquanto para Bruni foi o selo final da existência de sua empreitada.
Do movimento iniciado por Paulo Sá Pinto e por Lívio Bruni, surgiu uma nova cinematografia. No caso dos territórios monopolizados pela Serrador, sobressaíram exibidores regionais, alguns deles ligados à distribuição de filmes independentes, em especial de filmes europeus, que acabaram por estabelecer ciclos esporádicos de gêneros cinematográficos, a começar pela já citada filmografia espanhola e pelos filmes baseados nas mitologias grega e romana, sucedidos pelos western-spaghettis e, no início da década de 70, pelos filmes de kung-fu, além, é claro, dos filmes eróticos e das comédias francesas e italianas. Além desses filmes que buscavam o público popular, houve também, a expansão do “cinema de arte” criando nichos especializados de mercado.
Muitos exibidores partiram para a distribuição desses gêneros de filmes, como a Famafilmes, a Pelmex – uma produtora e distribuidora estatal mexicana – e a Condor Filmes, que usavam suas salas como vitrines dos produtos a serem exibidos em outras cidades e estados.
No final da década de 1960, encontramos um parque exibidor segmentado com partícipes regionais, que detinham um grande número de cinemas, destruindo os aspectos monopolísticos. Apenas na cidade do Rio de Janeiro, o principal alvo de Lívio Bruni, é que tal situação não se mostrava tão desconcentrada, já que a deterioração das salas remanescentes do Circuito Bruni não permitiam o confronto com o revigorado circuito de Luiz Severiano Ribeiro, que passava a ser dirigido por seu filho Luiz Severiano Ribeiro Jr. De qualquer forma, identifica-se, mesmo nesse território cinematográfico, o crescimento, ainda que relativo, da Art Films e da Cinema Star, de propriedade de Roberto Darze, que assumiu parte do antigo circuito de Bruni.
A expansão dos circuitos
A década de 1970 iniciou-se com forças totalmente diferenciadas do regime de duopólio. No Rio Grande do Sul, o mercado era liderado pela Arco-Íris de Mario Leopoldo dos Santos (Mário Pintado) que assumiria as salas dos irmãos Vallanci (Franco Brasileira) e da Famafilmes; no Paraná, a Famafilmes disputava a liderança do mercado metropolitano de Curitiba com a CIC. No interior do estado paranaense, diversos pequenos exibidores compunham circuitos regionais que, aos poucos, seriam adquiridos posteriormente pela Arco-Íris.
O mercado paulista tinha um perfil totalmente diferente da década anterior. Diversos exibidores expandiram seus negócios, a começar pela Cinematográfica Haway, de propriedade dos padeiros de origem portuguesa, Manoel Gregório e Hermenegildo Lopes, que abriu cinemas no centro da capital paulistana, na Av. Paulista e iria em direção à Av. Brigadeiro Faria Lima, onde a Sul-Paulista e a Companhia Serrador, tinham duas salas no recém-inaugurado primeiro shopping center do país, o Iguatemi (1967). O mercado antes monopolizado pela Companhia Serrador era, então, dividido entre os três grupos que cresciam.
No interior do estado, Emílio Pedutti, proprietário de cinemas na região Sudeste do estado, ampliava suas extensões para o Norte do Paraná e Sul de Mato Grosso, associando-se à empresa Araújo & Passos. Em 1979, a Haway compraria seus 87 cinemas, assim como os da Campineira de Cinemas, que dominava a região de Campinas. Na região de Santos, à época, a segunda cidade mais importante do estado, competia-se entre as salas dos Irmãos Campos e as da família Freixo. No Triângulo Mineiro, Wilton Figueiredo avançava sobre os cinemas da região e ia em direção à região de Ribeirão Preto.
A rápida recuperação da saúde financeira do Grupo Severiano Ribeiro, não acompanhada por seu rival, fortaleceu sua liderança no mercado carioca. Roberto Darze passou a compor um circuito para lançamento dos filmes da Columbia Pictures, capitaneado pela Art Films e complementado pelas poucas salas restantes da família Ferrez. Além desses cinemas que tinham capacidade de lançar apenas os filmes com o selo da Columbia e da própria Art Films, havia as salas da CIC, que exibiam os filmes de seus selos. Em Brasília, dividia-se o mercado entre as salas do Cine Brasília e Atlântida pertencentes a Severiano e as salas construídas pelo empreendedor local Karin Abduz. Severiano era hegemônico em todo o Nordeste, onde tinha apenas a Art Films como um concorrente de peso.
O empresário cearense não ingressara no mercado baiano, sendo este dividido entre a Condor (neste caso, após a venda das salas, a CIC) e a Art Films. Em Belo Horizonte, o empresário Antônio Luciano era o principal exibidor competindo com a Art Films. Severiano Ribeiro dominava a região Norte, com salas em Manaus e Belém.
*Trecho do artigo de Luiz Gonzaga Assis de Luca no livro “Cinema e Mercado”, volume III da coleção “Indústria Cinematográfica e Audiovisual Brasileira”, uma coedição do Instituto Iniciativa Cultural e Escrituras Editora.
Publicação autorizada pelo Centro de Análise do Cinema e do Audiovisual - CENA.

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BIBLIOGRAFIA DO SITE

PRINCIPAIS FONTES DE PESQUISA

1. Arquivos institucionais e privados

Bibliotecas da Cinemateca Brasileira, FAAP - Fundação Armando Alvares Penteado e Faculdade de Arquitetura e Urbanismo - Mackenzie.

2. Principais publicações

Acervo digital dos jornais Correio de São Paulo, Correio Paulistano, O Estado de S.Paulo e Folha de S.Paulo.

Acervo digital dos periódicos A Cigarra, Cine-Reporter e Cinearte.

Site Arquivo Histórico de São Paulo - Inventário dos Espaços de Sociabilidade Cinematográfica na Cidade de São Paulo: 1895-1929, de José Inácio de Melo Souza.

Periódico Acrópole (1938 a 1971)

Livro Salões, Circos e Cinemas de São Paulo, de Vicente de Paula Araújo - Ed. Perspectiva - 1981

Livro Salas de Cinema em São Paulo, de Inimá Simões - PW/Secretaria Municipal de Cultura/Secretaria de Estado da Cultura - 1990

Site Novo Milênio, de Santos - SP
www.novomilenio.inf.br/santos

FONTES DE IMAGEM

Periódico Acrópole - Fotógrafos: José Moscardi, Leon Liberman, P. C. Scheier e Zanella.

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